Olá, me chamo Gilcilane e todos me
conhecem por Gil.
Quando aos 11 anos comecei a dizer
que não queria viver a depender de homem algum, numa conversa de almoço com meu
pai, minha mãe e meu irmão, meu pai riu e disse: “...não é assim não minha
filha, toda mulher nasceu para servir a casa, sua família e a seu marido e
família quando se casar.” e a minha resposta foi – “...eu não pai, que absurdo,
quero ser independente.” - ele mas uma vez riu e disse: “Você é uma criança,
não precisa estudar tanto e muito menos ser independente, você tem tudo que
precisa, casa, família, viagens, tem é que saber fazer os deveres de uma dona
de casa, muito bem feito, que são, arrumar a casa, lavar, passar, cozinhar,
para que no futuro possa cuidar de sua família.”. Naquele momento, olhei para
minha mãe, e abaixei minha cabeça e continuei almoçando, as palavras não foram
embora, ficavam martelando dia após dia, mas minha cabeça me dizia - deixa isso
para lá, ele fala o que quer, você é quem sabe o que será e como será seu
futuro.
O tempo foi passando e eu não deixei
de continuar estudando...
Pronto, terminei meu antigo 2º grau,
agora - Ensino Médio. Aos 19 anos, resolvi que tinha que trabalhar (era um
martírio para mim, ter que pedir dinheiro ao meu pai para tudo), outro problema
familiar depois de alguns anos, e ao entregar meu currículo em uma agência, fui
chamada para entrevista e fui admitida na Empresa Protege (existente) e lá fui
eu, em pouco tempo, fui transferida para o carro forte e ao estar executando
meu trabalho em plena (av.) Rio Branco, meu tio - irmão do meu pai - me viu e a
frase me dita foi: “Te espero em casa.” - gelei, mas já era, não tinha como
continuar mentindo, dizendo que trabalhava de vendedora - só minha mãe sabia
qual era o meu trabalho (Mãe é MÃE, fica com o coração na mão, mas apóia
sempre), era só aguardar à tarde passar, à noite cair, para chegar em casa. Ao
chegar em casa, lá estavam, meu pai, meu tio e minha mãe, sentei e passei por
uma sabatina daquelas, com direito a pedir demissão, e já que queria tanto
trabalhar, iria ficar no Quartel do Bombeiro, obedecendo ordem como CASTIGO. E
foi o que aconteceu. Mas neste meio tempo, eu já havia passado no vestibular e
estava cursando a faculdade de Letras na UNISUAM, pagava a faculdade com o meu
trabalho, até porque, meu pai achava um absurdo ter uma mulher da família na
faculdade - é, isso mesmo, eu fui a 1ª mulher da família, tanto do meu pai e da
minha mãe, a estar cursando o Ensino Superior, e era dita a metida, pelos meu
próprios parentes (tios, tias, primos, primas), mas eu me sentia bem e a
pergunta de alguns era sempre – “...o que vc vai ganhar com isso?” e eu dizia: “...conhecimento,
me encontrar, descobrir o meu eu.”. E quando fui fazer a Pós-graduação, aí que
os comentários continuaram – “...nossa, do jeito que vai, ela não formará
família, só pensa em dar aula, assistir aulas, seminários, cursos e fazer o que
é correto de nossa família, nada, parece homem...” e por algum tempo, alguns
parentes me excluíam, por não ser feminina.
Mas eu segui em frente, sempre
acreditando nos meus sonhos, sempre pensando no futuro, acreditando que mesmo, mulher,
negra, de família machista, eu poderia e posso ser o que eu quiser, com meus
pés no chão, sem precisar passar por cima de pessoa alguma e seguindo forte na
minha fé.
E a vida segue, pois mesmo nos dias
de hoje, ainda é muito difícil, mostrarmos aos nossos jovens negros, que
podemos SER. Porque a mídia, só mostra o branco bem sucedido e mostrar ao jovem
que a cor da sua pele ACHOCOLATADA/NEGRA, é linnnnda, trata-se de uma guerra
diária, mas nada é impossível, de grão em grão, eu ei de fazer um pirão e lá na
frente me orgulhar de alguns, se espelharem nos nossos mestres, autores,
atrizes, médicos negros e galgar um futuro tão brilhante quanto o de seus
ídolos negros.
Essa sou eu - Gill
Salves, mulher, negra, hoje - MÃE.
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